22/10/2024
“Essa é a casa que eu construí. Toda minha economia está aqui. Eu vim para cá com 29 anos, hoje estou com 65. Trabalhava em dois serviços e tudo que eu juntei foi para essa casa”, diz Laurenilda Maria dos Santos sobre o lar que começou a construir com o marido há 36 anos e onde vive com a filha e os três netos.
Moradora da comunidade Sousa Ramos, encravada no meio da Vila Mariana, um dos bairros mais nobres de São Paulo, Laurenilda está apavorada diante da perspectiva de ser obrigada a deixar sua casa. “A gente não tem para onde ir.”
Desde setembro, ela e os outros cerca de 200 moradores da comunidade foram surpreendidos com a chegada de caminhões e tratores no lote ao lado – uma área que, na última revisão do zoneamento da cidade, no início deste ano, foi classificada como “zona especial de proteção ambiental”.
Em poucos dias, parte do pequeno córrego que corta a área foi coberto e todas as árvores que tomavam o morro foram cortadas. “Todo mundo chorava, chorava”, diz Laurenilda.
“Eu, que vivo tirando foto e filmando tudo, fiquei tão consternado que nem consegui fotografar. Só fiquei parado, com uma sensação de dor”, conta Eduardo Canejo, morador da comunidade há 16 anos e presidente da associação de moradores.Era o início, sem aviso prévio, de uma obra da prefeitura para a construção de um túnel de cerca de 500 metros de extensão com início na rua Sena Madureira, passando por baixo da avenida Domingos de Morais, até desembocar na rua Maurício Francisco Klabin, para – em teoria – desafogar o trânsito de carros.
Imaginado pela primeira vez ainda na década de 1970, quando a Linha 1-Azul do Metrô ainda nem tinha sido implementada, o projeto foi licitado em 2011. O contrato, no entanto, foi suspenso em 2013, sob a justificativa de que não haveria recursos no orçamento para o empreendimento. No pano de fundo, a obra e as empresas envolvidas – o consórcio Queiroz Galvão e Galvão Engenharia – tinham entrado nas investigações da Lava Jato.
Até 2019, o contrato continuou sendo suspenso continuamente. Até que, em 2022, se tornou uma prioridade para a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) – que busca a reeleição –, mas voltou a ser tocado somente neste ano pela mesma Galvão Engenharia e pela Queiroz Galvão, agora rebatizada Ayla Construtora.
A obra implica a remoção das dezenas de famílias que vivem nas 85 casas da Sousa Ramos, várias delas com crianças e idosos. Há, ainda, cinco pessoas que fazem tratamento de câncer nos hospitais da região.
Até o momento, os moradores nem sequer foram contatados oficialmente pela prefeitura. Mas, por documentos públicos, sabem que o traçado do túnel passará pela comunidade, que fica em terreno da prefeitura. Os moradores da comunidade vizinha, em uma área em parte privada e em parte pública, também terão que sair para dar lugar ao canteiro de obras e ao alargamento de uma via.
POR QUE ISSO IMPORTA?
* Empreendimento que vai evitar trânsito em apenas um farol vai remover mais de 200 pessoas que vivem há décadas na comunidade Sousa Ramos e, até agora, não foram contatadas pela prefeitura.
* Projeto original era de 2011, da gestão Kassab. A Controladoria-Geral do Município apontou neste ano indícios de sobrepreço no contrato original, mas gestão Nunes não fez nova licitação nem novo estudo de impacto ambiental.
“Nossa comunidade tem mais de 50 anos. É uma vida inteira aqui dentro. Não tem como de uma hora para outra sermos removidos, como se a gente fosse rato”, diz Anália do Nascimento, que mora na Sousa Ramos há 28 anos. Sua filha mais velha se formou em direito em uma faculdade próxima, a mesma em que seu filho mais novo planeja entrar em breve. Seus netos pequenos, que moram com ela, estudam em escolas do bairro.
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