01/10/2024
O rio Atrato, na Colômbia, devia ser um símbolo mundial da proteção dos direitos da natureza, após uma inédita decisão judicial na Colômbia. Em 2016, a Corte Constitucional declarou seu leito, bacia e afluentes como uma "entidade viva" e "sujeito de direitos" à proteção e preservação.
Porém, oito anos depois, o curso d´água continua sofrendo com o garimpo ilegal, o conflito armado e a pobreza.
Localizado em uma região de floresta e sem boas rodovias, seus 750 quilômetros são a via principal de uma região historicamente marginalizada, de maioria afrodescendente (87%) e a mais pobre do país.
Até algumas décadas atrás, o Atrato era uma fonte de frescor no calor implacável no oeste da Colômbia. Mas hoje suas águas transbordam mercúrio, usado no garimpo para separar as partículas de ouro dos sedimentos.
"É um rio com direitos feridos e violados", resume a ambientalista Ligia Ortega.
Em outubro, a Colômbia sediará a COP16, conferência das Nações Unidas sobre a biodiversidade, o que pode fazer com o que o rio volte ao centro de debates.
Pouca vontade do Estado, falta de interesse em criar políticas públicas e corrupção são alguns dos entraves que impedem que a decisão saia do papel, explica o magistrado que deu a sentença em favor do rio, Jorge Palacio.
A sentença também designou 14 guardiões, que são os representantes legais e a voz do rio. Um deles não esconde a tristeza ao lembrar das águas cristalinas onde se banhava quando era criança.
"Nossos pais nos deixaram um rio transparente, límpido, e hoje nós temos a obrigação de fazer o mesmo, e acho que estamos falhando", diz Ramón Cartagena, 59.
"Sentimos um sabor agridoce", acrescenta. "O garimpo ilegal continua se expandindo todos os dias". Para ele, a implementação da sentença a favor do rio avança a "passos de tartaruga".
O Atrato brota de uma montanha a 3.900 metros de altitude. Ali, sua água é cristalina e potável, mas à medida que a corrente avança, vai revelando contaminação e outros problemas: desmatamento, pobreza, ausência do Estado e a guerra entre a guerrilha do Exército de Liberação Nacional e o Clã do Golfo, o maior cartel de narcotráfico do país.
À vista de todos, dragas gigantescas aspiram o leito do rio em busca de ouro. Quem navega por ali, desvia os olhos temendo represálias.
"As pessoas têm medo de denunciar, todo mundo fica calado", lamenta Bernardino Mosquera, 62, outro guardião. As lideranças denunciam ameaças de morte no país mais perigoso do mundo para os defensores do meio ambiente.
Além do risco imposto pela violência, estudos demonstram que o mercúrio prejudica a saúde dos ribeirinhos.
"Onde há maior ingestão de peixe é onde há mais concentração de mercúrio em humanos", observa José Marrugo, pesquisador da Universidade de Córdoba. Segundo o especialista, foram identificados moradores "em risco" e com "intoxicação crônica".
As dragas também reviram a terra e liberam outros elementos metálicos tóxicos, como arsênio, chumbo e cádmio.
Arnold Rincón, diretor da autoridade ambiental local, assegura que 34% da área degradada pela atividade mineradora em 2016 foi recuperada. Ele afirma, ainda, que o nível de mercúrio está abaixo do limite na água —mas os peixes que são consumidos pela população não são alvo das análises.
No mercado de Quibdó, capital do departamento de Chocó, os vendedores reclamam. "As pessoas temem comprar peixe porque há muito mercúrio e tem gente que foi muito afetada", diz Narlin Córdoba, 46.
Segundo a Defensoria do Povo, após a sentença, não há evidências de "nenhum tipo de avanço que contribua para a conservação efetiva" do rio.
Conclua a leitura desta reportagem acessando a Folha de S. Paulo
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