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Como um megatsunami gerou onda de 200 metros que durou 9 dias

19/09/2024

Um gigantesco deslizamento de terra em um fiorde na Groenlândia desencadeou uma onda que "sacudiu a Terra" por nove dias.
O sinal sísmico foi captado por sensores de todo o mundo em setembro do ano passado, levando os cientistas a investigar de onde ele vinha. O deslizamento —uma encosta rochosa que desabou, levando com ela o gelo glacial— gerou uma onda de 200 metros no mar.
A onda ficou então confinada em um estreito fiorde, movendo-se para frente e para trás por nove dias, gerando as vibrações.
Os cientistas afirmam que deslizamentos de terra como este vêm acontecendo com mais frequência na Groenlândia. O motivo são as mudanças climáticas, que causam o degelo dos glaciares que sustentam as montanhas da região.
Os resultados da investigação do evento foram publicados na revista Science. Eles são as descobertas de uma verdadeira missão de detetive que envolveu uma equipe internacional de cientistas e a marinha dinamarquesa.
"Quando os colegas identificaram este sinal pela primeira vez no ano passado, não se parecia em nada com um terremoto", relembra Stephen Hicks, do University College de Londres, um dos cientistas envolvidos no estudo. "Nós o chamamos de ´objeto sísmico não identificado´."
"Ele continuou aparecendo a cada 90 segundos, por nove dias."
Um grupo de cientistas curiosos começou a discutir aquele sinal desconcertante em uma plataforma de bate-papo online.
"Paralelamente, colegas da Dinamarca, que fazem muito trabalho de campo na Groenlândia, receberam relatos de um tsunami que aconteceu em um fiorde remoto", relembra Hicks. "Nós então reunimos nossas forças."
A equipe usou os dados sísmicos para identificar o local da fonte do sinal como sendo o fiorde de Dickson, no leste da Groenlândia. Eles então coletaram outras indicações, como imagens de satélite e fotografias do fiorde, tiradas pela marinha dinamarquesa pouco antes do surgimento do sinal.
Uma imagem de satélite mostra uma nuvem de poeira em uma ravina no fiorde. E, comparando as fotografias de antes e depois do evento, foi possível verificar que uma montanha havia desabado, carregando parte de um glaciar para a água.
Os pesquisadores concluíram que 25 milhões de metros cúbicos de rocha —volume equivalente a 25 vezes o Empire State Building, em Nova York— atingiram a água, causando um "megatsunami" de 200 metros de altura.
Nas fotografias do local tiradas depois do evento, existe uma marca visível no glaciar, deixada pelo sedimento que a onda gigante arremessou para cima.
Os tsunamis são normalmente causados por terremotos subterrâneos e se dissipam no mar aberto em questão de horas. Mas esta onda ficou presa no fiorde.
"Este deslizamento de terra aconteceu a cerca de 200 km de distância do mar aberto", explica Hicks. "E estes sistemas de fiordes são muito complexos, de forma que a onda não conseguiu dissipar sua energia."
A equipe criou um modelo que mostra como a onda ficou se agitando para frente e para trás, por nove dias, em vez de se dissipar. "Nunca havíamos visto um movimento de água em tamanha escala por um período tão longo", afirma Hicks.
Os cientistas explicam que o deslizamento de terra foi causado pelo aumento das temperaturas na Groenlândia, que fez derreter o glaciar na base da montanha.
"Aquele glaciar estava sustentando a montanha, até que ele ficou tão fino que simplesmente deixou de mantê-la no lugar", explica Hicks. "Isso mostra o impacto atual das mudanças climáticas sobre aquela região."
Este evento ocorreu em uma região remota, mas alguns navios de cruzeiro pelo Ártico visitam os fiordes. Felizmente, nenhum deles estava na região quando ocorreu o deslizamento de terra.
O principal pesquisador do evento, Kristian Svennevig, do Serviço Nacional de Pesquisa Geológica da Dinamarca e da Groenlândia (GEUS, na sigla em dinamarquês), declarou que este é um fenômeno cada vez mais comum no Ártico.
"Estamos presenciando um aumento dos deslizamentos de terra gigantes, que causam tsunamis, particularmente na Groenlândia", declarou ele à BBC.
"Isoladamente, o evento do fiorde de Dickson não confirma esta tendência, mas sua escala sem precedentes ressalta a necessidade de conduzirmos mais pesquisas."
Para Stephen Hicks, o evento do fiorde de Dickson "talvez seja a primeira vez em que um evento causado pelas mudanças climáticas tenha causado impactos sobre a crosta embaixo dos nossos pés em todo o mundo."

Fonte: Folha de S. Paulo

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