17/10/2024
Pilar de desenvolvimento sustentável, a bioeconomia constará, pela primeira vez, do comunicado final do G20. Ao liderar as discussões, o governo brasileiro incluiu entendimentos sobre o tema que se associam à nova estratégia nacional. No primeiro semestre de 2025, o Ministério do Meio Ambiente vai lançar o Plano Nacional de Desenvolvimento da Bioeconomia, que visa a fomentar as economias da floresta e da sociobiodiversidade.
Os princípios de Alto Nível sobre Bioeconomia, publicados pelos países-membros do G20 no mês passado, vão além do conceito de recurso biológico e abrangem elementos de sistemas produtivos e conhecimentos tradicionais. Secretária nacional de Bioeconomia, Carina Mendonça Pimenta celebrou a posição de países florestais no centro das discussões. Sucessora do Brasil na presidência do G20, a África do Sul afirmou que dará continuidade à agenda.
— Foi um avanço significativo e muito importante para os interesses do Brasil. O documento também faz referência a como a bioeconomia vai contribuir para a agenda do clima — afirma Pimenta, destacando que os princípios formam um marco constitucional para novos passos, como financiamentos e cooperações técnicas. — Um salto bem interessante foi o reconhecimento de que o motor da bioeconomia é o uso da tecnologia ligada à natureza.
Em junho, o governo brasileiro publicou decreto que institui a Estratégia Nacional de Bioeconomia. A futura Comissão Nacional será responsável pela construção de uma política pública cuja versão final será lançada no próximo ano.
O fomento às economias das florestas e da sociobiodiversidade será um eixo. Outro é associar a bioeconomia à restauração e conservação das florestas. Por isso, um dos objetivos da Secretaria Nacional é incentivar hubs no interior da Amazônia, para fortalecer estruturas de pesquisas em áreas prioritárias no combate ao desmatamento e na recuperação de vegetação.
— Como vai fazer restauro em larga escala sem estruturar cadeias de negócio? Aí é que entra bioeconomia. Vamos fortalecer ecossistemas regionais, investindo em parcerias com universidades e logística para produtos — diz a secretária, que acrescenta ações para facilitar a parceria entre instituições brasileiras e internacionais na Amazônia.— Vamos criar um ambiente favorável, com regulamento claro, e anunciar uma rede de instituições de pesquisa de excelência em biodiversidade.
A Amazônia é um bioma pouco explorado nessa área. Segundo o Sistema Nacional de Gestão do Patrimônio Genético (Sisgen), metade das pesquisas sobre biodiversidade focam na Mata Atlântica. Há 77 mil pesquisas registradas sobre uso de biodiversidade brasileira, que geram produtos como medicamentos, alimentos, cosméticos e insumos agrícolas.
Lançada neste ano, a Plataforma Digital da Floresta conecta bioprodutores amazônicos a compradores de todo o Brasil, iniciativa que visa acelerar esse ambiente de negócios. O projeto, da Fundação Certi, é dividido entre o Vem de Onde, um sistema de rastreamento da origem dos frutos; o BioConex, marketplace para negócios entre cooperativas e compradores; e o BI da Floresta, painel com informações das cadeias da castanha e do açaí, incluindo produção de safra e logística.
— Focamos nos atores das cadeias produtivas para destravar o enorme potencial de mercado. Queremos gerar condições de negociações mais favoráveis para quem está na comunidade, os extrativistas e as cooperativas, que são o elo fraco da cadeia —diz Marco Antonio Giagio, diretor geral do Instituto Certi Amazônia.
O Vem de Onde, em fase piloto, mostra o caminho de um produto desde a sua origem. Toda extração é registrada no sistema por quantidade, território e período. Assim, a indústria compradora pode associar o lote a um QR Code na embalagem do produto a ser conferido pelo consumidor.
O BioConex, lançado em janeiro, tem 25 cooperativas habilitadas de oito cadeias produtivas, como açaí, cacau e castanha. A plataforma ainda traz uma central de logística de dois mil operadores da Amazônia, com fretes para qualquer lugar do Brasil e mecanismos de financiamento ao comprador.
Giagio aposta no mercado de 40 mil indústrias da Amazônia, com destaque às cadeias de cosméticos, fármacos e, principalmente, alimentos e bebidas.
— Precisamos aproveitar mais as oportunidades que a Amazônia oferece. Tem que ter muito mais apoio e financiamento, e as políticas públicas precisam considerar as especificidades das cadeias em cada região. Não pode ser uma ação genérica, porque a Amazônia é complexa por natureza.
Enquanto o mundo avança na discussão sobre bioeconomia, a Natura cria seus produtos com base em ativos amazônicos como castanha do pará, andiroba, tucumã e ucuuba há quase 25 anos. Em 2011, a empresa criou o Programa Amazônia e instalou uma fábrica de sabonete em barra em Benevides (PA), com centro de pesquisa para identificar e desenvolver novos ingredientes da floresta, em um trabalho próximo às comunidades tradicionais.
A empresa implantou 19 minifábricas nas áreas das principais cooperativas parceiras, que fornecem óleo ou manteiga extraídos das sementes. Hoje, há 44 bioingredientes, de cerca de 90 diferentes cadeias de insumo, em um trabalho com dez mil famílias na Amazônia.
Diretora de sustentabilidade da Natura, Angela Pinhati destaca duas cadeias como exemplos de negócios economicamente vantajosos e que não agridem a floresta. Um dos ativos mais recentes é o tucumã, abundante no Pará, mas subvalorizado até que fosse identificada sua propriedade que estimula a produção de ácido hialurônico no corpo, espécie de hidratante natural.
— Enquanto vemos produtos com base química, você encontra ativos na própria natureza. Temos ouro nas mãos com a Floresta Amazônica — afirma Angela, que também destaca a cadeia da ucuuba, que com suas sementes, hoje gera três vezes mais renda às famílias que antes cortavam os troncos para venda de cabos de vassouras.— Materializa como é possível fazer negócio mantendo a floresta em pé. Sem ser filantrópico, é negócio do início ao fim.
O principal ativo da Ambev na Amazônia é o guaraná. Desde 1971 a empresa mantém a Fazenda Santa Helena, que produz 20 mil mudas por ano na cidade de Maués (AM), conhecida como a Terra do Guaraná. Em 2017, foi criada a Aliança Guaraná Maués, para melhorar a qualidade de vida e aprofundar as relações com a população local, em especial agricultores, indígenas e outros atores envolvidos na cadeia.
— A sustentabilidade sempre fez parte do DNA da Ambev, e incluir discussões como essas no G20 abre mais portas — celebra Sumayra Leão, gerente fabril da Ambev. — Estamos falando de benefícios para todo o ecossistema e o planeta. O campo, o agro e as florestas são essenciais para a vida.
Fonte: O Globo
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